Nossa parceria com a América Latina: discurso do Ministro de Relações Exteriores no Chile
Falando no Centro Cultural Gabriela Mistral de Santiago, James Cleverly delineou o futuro ambicioso das relações Reino Unido-América Latina e pediu que a região tenha uma voz maior no cenário mundial.
Obrigado por me receber.
É uma honra estar aqui. Nosso cenário tem muita ressonância para a história política recente do Chile.
Construído por voluntários durante a presidência de Allende.
Requisitado pelo Ministério da Defesa na era Pinochet.
Renascido como Centro Cultural, agora leva o nome de uma das duas chilenas ganhadoras do Prêmio Nobel, Gabriela Mistral.
Duzentos anos atrás, uma luta revolucionária feroz estava ocorrendo em ambos os lados do Atlântico.
Uma batalha de ideias em que a liberdade, a autodeterminação e o governo representativo se colocam contra o absolutismo e a autocracia.
Atingiu seu clímax dramático aqui. Na América Latina.
Sob a liderança inspiradora de figuras como Simon Bolívar, Bernardo O’Higgins, José de San Martín ou Miguel Hidalgo.
A luta da América Latina pela independência foi certamente um dos episódios mais edificantes da importante era revolucionária que lançou as bases do mundo moderno.
Um conto de dificuldades, perseverança, exílio e traição.
De vitórias impressionantes e sacrifícios extraordinários.
De inspiração, liderança e unidade.
Desde o início, meu grande e talentoso antecessor, George Canning, previu que a América Latina seria o equilíbrio de poder na política mundial.
E este é também o continente que deu origem ao gênero extraordinário que é o realismo mágico…
E imagine se eu estivesse fazendo esse discurso na tradição do realista mágico…
… Eu diria a você que George Canning apareceu para mim em meus sonhos…
… assumindo a forma de um poderoso, poderoso jaguar…
…transmitindo uma mensagem para eu passar para você.
Embora, na verdade, isso não tenha acontecido.
Mas a sabedoria de Canning sobre “O Novo Mundo sendo chamado à existência para restabelecer o equilíbrio do Velho” soa tão verdadeira hoje quanto quando ele disse isso em 1826.
O fascínio e o romance deste continente atraíram muitos outros.
Incluindo milhares de veteranos endurecidos pela batalha que se voluntariaram nas Legiões Britânicas.
Homens como James Rooke, que deu nome a um batalhão do exército colombiano. Ou o almirante Thomas Cochrane.
O homem que Napoleão apelidou de “o Lobo do Mar”.
E quem estabeleceu tanto a primeira Esquadra Naval do Chile quanto a antepassada da atual Marinha do Brasil.
Ou Martin Guisse, que fundou a Marinha do Peru.
Estou encantado que os navios de guerra das marinhas latino-americanas levem seus nomes até hoje.
Também estou orgulhoso do papel que o Reino Unido desempenhou no apoio à luta pela independência da América Latina.
E em construir as bases para o seu sucesso subseqüente.
Engenheiros britânicos e finanças britânicas ajudaram a construir as ferrovias e os portos que ligavam a América Latina aos mercados de todo o mundo.
Duzentos anos depois daquele período revolucionário, as placas tectônicas da política mundial estão se movendo mais uma vez.
Hoje quero falar sobre valores, clima e laços compartilhados entre nossos povos. Estamos vivendo o início de uma nova era de competição geopolítica.
Ao lado dessas tendências, uma batalha de ideias está ocorrendo mais uma vez.
Desta vez, seu foco está na natureza e no futuro da ordem internacional.
Nossa posição é clara.
O respeito pela soberania, o respeito pela integridade territorial, o respeito pela autodeterminação e os direitos humanos devem prevalecer.
Ao lado da democracia, o estado de direito, e a liberdade.
Eleições livres e justas são a base de qualquer democracia estável e saudável. Sei que esses valores são compartilhados em toda a América Latina, embora ainda não sejam apreciados por todos.
Seu apoio na ONU ao direito da Ucrânia de se defender contra a agressão russa deixou isso bem claro.
Falando em autodeterminação e democracia, seria negligente da minha parte não falar sobre Falklands.
Os habitantes das Ilhas Falklands, como todo mundo, merecem a liberdade de decidir seu próprio futuro, em termos políticos, culturais, econômicos e de desenvolvimento.
Seu referendo de 2013 deixou claro que eles desejam manter seu relacionamento atual com o Reino Unido, como é seu direito absoluto.
E o Reino Unido continuará a apoiá-los.
Mas proteger a autodeterminação e a democracia não é o único desafio.
Vivemos em um mundo de crescentes ameaças transnacionais.
A mudança climática é o exemplo mais urgente e óbvio.
Precisamos de instituições multilaterais fortes, que representem o mundo como ele é hoje, econômica, política e demograficamente.
Este não é o caso atualmente.
O Reino Unido reconhece isso. E queremos trabalhar com você para mudar isso. Os países da América Latina têm um papel decisivo a desempenhar na reformulação da ordem internacional e do sistema multilateral para se readequar ao mundo do século XXI.
Assim como Canning previu.
A população deste canto do nosso planeta e sua economia cresceram rapidamente nas últimas décadas.
No ano do meu nascimento, 1969, a América Latina abrigava 279 milhões de pessoas. Hoje esse número é de mais de 664 milhões de pessoas.
Seu peso demográfico e econômico lhe dá um papel fundamental para determinar se a ordem internacional perdurará.
Como eu disse em dezembro passado, a mudança no poder mundial é evidente há algum tempo.
E é meu objetivo como Ministro de Relações Exteriores do Reino Unido garantir que nosso pensamento estratégico reflita esse simples fato.
É por isso que vim para a América Latina esta semana.
Quero levar adiante a agenda definida em 2010 por meu antecessor William Hague na Canning House em Londres.
Desde então, abrimos ou reabrimos Embaixadas e Altos Comissariados em toda a região.
O Reino Unido tem dezenas de cônsules honorários de Tijuana, na fronteira México-EUA, até Punta Arenas, no extremo sul do Chile.
O Reino Unido recebeu milhares de bolsistas do Chevening em nossas universidades. E o número de latino-americanos que visitam o Reino Unido quase dobrou.
O Conselho Britânico ampliou seu alcance em cinco vezes desde 2010, alcançando mais de 100 milhões de pessoas nas Américas no ano passado.
O comércio e o investimento do Reino Unido com a América Latina se recuperaram fortemente no ano passado após sua baixa pós-pandemia.
O valor total das importações e exportações aumentou 45% no ano passado, para mais de £ 40 bilhões.
Mas com a América Latina representando apenas 2% das importações do Reino Unido e apenas 2,5% das exportações do Reino Unido em todo o mundo, reconheço que há muito mais a ser feito em comércio e investimento.
Nosso foco estratégico compartilhado em minerais críticos, hidrogênio verde e infraestrutura sustentável é encorajador.
A iminente adesão do Reino Unido à Parceria Transpacífica, juntando-se ao México, Peru e Chile, é um passo positivo.
E esperamos que em breve se juntem Costa Rica, Equador e Uruguai.
Na semana passada, o Reino Unido concluiu a terceira rodada de negociações sobre um Acordo de Livre Comércio Reino Unido-México.
Juntos, temos uma forte voz democrática em favor do sistema internacional baseado em regras.
Juntos, devemos falar contra as ameaças sistêmicas a esses valores decorrentes de várias partes do globo.
E juntos devemos trabalhar juntos no clima, nos direitos das mulheres e meninas, energia verde, segurança cibernética, ciência e tecnologia.
Na COP26 em Glasgow, meu país prometeu £ 300 milhões para proteger a Amazônia. Como resultado do nosso Programa de Parcerias para Florestas, que vi há poucos dias na Colômbia, mais de 62.000 hectares de terra estão sendo manejados de forma sustentável na Colômbia e no Peru.
Outro foco conjunto é o triângulo de lítio globalmente estratégico que fica entre Argentina, Bolívia e Chile.
O investimento de bilhões de dólares da Rio Tinto está previsto para render 100.000 toneladas de lítio até 2027.
Isso alimentará a revolução da bateria verde.
Apoiamos o Chile na venda de títulos no valor de mais de £ 21 bilhões no mercado de títulos sustentáveis de Londres.
Alavancamos US$ 464 milhões em financiamento verde para o México.
Nossa tecnologia de hidrogênio verde oferece aos agricultores latino-americanos uma alternativa mais barata e limpa do que os fertilizantes à base de petróleo, aumentando a segurança alimentar em todos os lugares.
Como parte de nossa Estratégia Internacional para Mulheres e Meninas, o Reino Unido ajudou os ex-alunos do Chevening a estabelecer uma ONG focada em gênero chamada Hace la Fuerza.
Reunindo mulheres da Argentina, Colômbia, México, Paraguai, Peru e Uruguai, construímos uma comunidade de futuras líderes latino-americanas.
Porque quando os direitos das mulheres são avançados, todos ganham.
Esses exemplos – e outros como eles – mostram como a parceria entre o Reino Unido e os países da América Latina pode fazer uma diferença real.
Não apenas para nossa segurança e prosperidade.
Mas para o mundo inteiro.
Há tanto que eu gostaria que fizéssemos juntos.
Nossos roteiros conjuntos bilaterais definirão a direção no Brasil, na Colômbia, no Peru e em outros lugares.
Os valores universais sobre os quais se baseia a ordem internacional são atemporais. Mas as instituições multilaterais do nosso mundo precisam sim de reforma, em particular para dar mais voz e mais influência à América Latina.
O Reino Unido quer que o Brasil seja membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.
E devemos trabalhar para uma reforma mais ampla, em parceria com outros. O apelo à reforma sistêmica de nossas instituições financeiras internacionais deve ser fortalecido.
Juntos, nós podemos destrancar os investimentos verdes críticos que esta região precisa do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento.
O governo do Reino Unido apóia o ímpeto por trás da Iniciativa Bridgetown do primeiro-ministro Mottley.
Os mais pobres e vulneráveis devem se beneficiar da reforma das instituições financeiras internacionais.
A reforma tributária internacional, juntamente com a repressão à lavagem de dinheiro e ao financiamento ilícito, impedirá o vazamento do tão necessário financiamento dos tesouros nacionais.
É por isso que o Reino Unido está fornecendo £ 20 milhões para reformas do estado de direito e anticorrupção no Panamá, Colômbia, Equador e Peru. E £ 2,2 milhões para a reforma tributária no Brasil.
Mas não devemos negligenciar os laços interpessoais.
O Reino Unido é o lar de mais de um quarto de milhão de latino-americanos – entre eles estão 71 jogadores da Premier League inglesa, incluindo 6 jogadores da seleção argentina vencedora da Copa do Mundo.
Meu time Arsenal, mesmo com 3 fantásticos jogadores brasileiros, todos chamados Gabriel, ainda não conseguiu vencer o campeonato.
Centenas de milhares de britânicos visitam esta região excepcionalmente bela todos os anos.
O espanhol já é a segunda língua estrangeira mais popular nas escolas britânicas – e está previsto para ocupar o primeiro lugar nos próximos anos.
Quero que seus melhores e mais brilhantes pesquisadores e alunos venham para as universidades líderes mundiais do Reino Unido.
E eu quero que mais estudantes britânicos venham para a América Latina para estudar também.
Devemos ser ambiciosos para o nosso relacionamento futuro.
Não apenas pelos laços históricos de amizade que nos unem há mais de 200 anos. Mas porque todos apreciamos os mesmos valores fundamentais que inspiraram a criação da ordem internacional.
Ela só evoluirá, sobreviverá e finalmente prosperará com o apoio e o envolvimento sincero desta grande região.
Duzentos anos atrás, Simon Bolívar disse que “a liberdade do Novo Mundo é a esperança do universo”.
Seu amor pela liberdade continua a inspirar o mundo hoje.
É por isso que vim de Londres para reviver velhas amizades e construir novas. E para prometer nosso compromisso de longo prazo.
Estou oferecendo o apoio do Reino Unido nas questões que mais nos preocupam juntos. E eu peço o seu em troca.
Como parceiro.
Mas, ainda mais importante, como representante do amigo mais antigo deste continente.
Obrigado.